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MECANISMO DE TOXICIDADE

 

Nas células cerebrais existem receptores excitatórios e inibitórios e um dos principais neurotransmissores inibitórios é a glicina. A estricnina liga-se aos mesmos receptores que a Glicina (GlyRs) mas não tem qualquer efeito inibitório. Ao invés, impede a ligação do seu ligando natural, a glicina, impedindo assim o seu efeito inibitório (Dutertre et al. 2012) (ver Imagem). A estricnina é inibidora direta de sinapses inibitórias, um papel quase único (Toman 1963). Assim, os impulsos nervosos são desencadeados através da ligação de uma menor quantidade de neurotransmissor excitatório do que numa situação normal. A estricnina afeta particularmente os neurónios motores ao nível da medula espinal e do tronco cerebral (Wroblewski and Danysz 1989), neurónios estes que controlam a contração dos músculos. Desta forma, a estricnina desencadeia contrações musculares e convulsões extremamente violentas, que são muitas vezes fatais (Boyd et al. 1983). A morte ocorre por asfixia pois durante as convulsões há contração permanente do diafragma e de outros músculos fundamentais para a respiração (Warning et al. 2007).

 

O envenenamento por estricnina nem sempre é fatal mas as fortes contrações musculares deixam sequelas bem marcadas no indivíduo. Algumas das complicações que ocorrem nos sobreviventes são:

 

  • Falência de múltiplos órgãos devido à produção de calor resultante da contração muscular. Já foram documentadas temperaturas da ordem dos 43ºC em pacientes que sobreviveram ao envenenamento. (Warning et al. 2007);

 

  • Acidose lática  pois devido à extrema atividade, os músculos são “forçados” a obter energia a partir do metabolismo anaeróbio, gerando grandes concentrações sanguíneas de ácido lático, provocando um abaixamento significativo do pH do sangue. Este valor situa-se normalmente entre 7,35 e 7,45, sendo que um grande decréscimo do valor de pH do sangue pode levar a coma ou mesmo à morte (Rosival 2010);

 

  • Rabdomiólise pois devido ao calor e à extrema contração, há rotura das fibras musculares, libertando enormes quantidades de mioglobina, o que pode levar a uma sobrecarga renal. Em situações limite pode mesmo levar a insuficiência renal (Shideman and Mannering 1963).

 

 

REFERÊNCIAS:

Dutertre S, Becker CM, Betz H (2012) Inhibitory glycine receptors: an update. J Biol Chem 287(48):40216-23.

 

Toman JEP (1963) Some Aspects of Central Nervous Pharmacology. Annu Rev Pharmacol 3(1):153-184.

 

Wroblewski JT, Danysz W (1989) Modulation of glutamate receptors: Molecular mechanisms and functional implications. Annu Rev Pharmacol Toxicol 29:441-474.

 

Boyd RE, Brennan PT, Deng JF, Rochester DF, Spyker DA (1983) Strychnine poisoning. Recovery from profound lactic acidosis, hyperthermia, and rhabdomyolysis. Am J Med 74(3):507-12.

 

Warning RH, Steventon GB, Mitchel SC (2007) Strychnine Molecules of Death. 2nd edn. Imperial College Press, London, p 367-384.

 

Rosival V (2010) Very low blood pH is life threatening. Kidney Int 78(1):112-113.

 

Shideman FE, Mannering GJ (1963) Metabolic Fate. Anual Review of Pharmacology and Toxicology 3:33-56.

 

Mecanismo de toxicidade da estricnina: impedimento da ligação da glicina ao seu recetor

Efeitos da estricnina numa rã

Trabalho realizado no âmbito da discilplina de Toxicologia Mecanística no ano lectivo 2014/2015 do Curso de Mestrado Integrado em Ciências Farmacêuticas da Faculdade de Farmácia da Universidade do Porto (FFUP).

Este trabalho tem a responsabilidade pedagógica e científica do Prof. Doutor Fernando Remião (remiao@ff.up.pt) do Laboratório de Toxicologia da FFUP.

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